sexta-feira, 24 de abril de 2009

As Competências do Profesor e o Construtivismo na Sala de Aula

Aula
Anne Louise Scarinci1
Jesuína Lopes de Almeida Pacca2
Universidade de São Paulo, Instituto de Física
INTRODUÇÃO
Atualmente os pesquisadores estão muito preocupados em definir competências
do professor, e inúmeros trabalhos foram elaborados tomando esse tema como objeto. A
intenção principal parece ser exatamente a de poder orientar a formação docente,
servindo de referencial para as instituições de formação.
Assim, Schön, Zeichner e Perrenoud, entre outros, procuraram equacionar uma
série de competências que delineariam uma boa atividade docente, tanto em termos de
descrições do que são facetas da educação tradicionalmente consideradas válidas, como
em termos de projeções de competências que emergem atualmente.
Por outro lado, paralelamente ou mesmo um pouco antes, as pesquisas se
ocuparam muito com o caráter construtivista da atuação do professor. Em atenção aos
estudos na área da psicologia do aprendizado e procurando formular os desdobramentos
das teorias epistemológicas para o meio educacional, um grande esforço foi feito em
busca de que atitudes e ações do professor seriam condizentes com as teorias
construtivistas e favoreceriam a aprendizagem significativa dos alunos.
Embora os dois movimentos tenham sido frutos de origens diversas, como ambos
se dirigem diretamente às características do professor, certamente devemos conseguir
encontrar vários pontos de interconexão.
Nesse artigo, procuramos relacionar um instrumento de base empírica
desenvolvido para avaliar características construtivistas de um grupo de professores, em
comparação com um conjunto de competências descritas pela literatura. Privilegiaremos,
para tanto, o livro de Perrenoud (2000), intitulado Dez Novas Competências para Ensinar.
A compilação desse autor é, na verdade, muito próxima a outras listas de competências
retratadas por outros autores renomados da área, de forma que não limita ou estreita
demasiadamente o recorte.
AS COMPETÊNCIAS EM PERRENOUD
Philippe Perrenoud participou, em Genebra, da elaboração de um conjunto de
competências desejáveis ao professor, destinadas à orientação de cursos de formação
continuada promovidos por aquela cidade. Partindo desse referencial, sistematizou um
inventário das competências enunciadas no documento de Genebra, comentando-as e
classificando-as em dez grupos mais amplos. Descreveremos brevemente a significação
dada pelo autor aos grupos de competências.
1. Organizar e dirigir situações de aprendizagem
1 Apoio CNPq.
2 Apoio do CNPq e da Fapesp.
2
Pressupõe-se que o ensino não mais se limita a uma forma magistral de
transmissão de conteúdos. Procuram-se, ao invés, pedagogias que incluam os aprendizes
no processo e, para isso, as situações de aprendizagem devem ultrapassar o clássico
“ouvir a lição”.
2. Administrar a progressão das aprendizagens
A aprendizagem é vista como pertencente a um percurso individual de cada aluno.
Dessa forma, é desejável que seja tomada numa perspectiva de mais longo prazo, o que
leva o professor a um papel maior nas decisões de progressão.
3. Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação
Opõe-se a pedagogia diferenciada à pedagogia frontal, a qual Perrenoud traduz
como “a mesma lição, os mesmos exercícios para todos” (ibid, p.55). Almeja-se colocar
cada aluno, individualmente, em situações de aprendizagem ótimas para ele,
considerando seus conhecimentos prévios, sua relação com o saber e seus interesses.
4. Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho
O texto admite que a responsabilidade pela motivação dos alunos transcende os
domínios do professor, porém focaliza a contribuição deste com o que lhe for tangível.
5. Trabalhar em equipe
Saber cooperar, por vários motivos, como a premência dos ciclos de
aprendizagem e a inclusão na escola de vários profissionais com papéis especializados
(psicólogos, coordenadores de área, etc.), está-se tornando, segundo defende Perrenoud,
“uma necessidade ligada à evolução do ofício do professor” (ibid, p. 80).
6. Participar da administração da escola
A colaboração dos professores junto ao pessoal administrativo para a gestão da
escola incentivaria a modernização do sistema educativo e a construção de relações de
trabalho baseadas na confiança e na autonomia. Por isso, Perrenoud ressalta a
importância do professor em “sair da sala de aula, interessando-se pela comunidade
educacional em seu conjunto” (ibid, p. 96).
7. Informar e envolver os pais
A parceria com os pais na educação é obviamente desejável, porém a
comunicação entre pais e professores nem sempre é profícua, devido a fatores como
mecanismos de defesa, relações de poder e desconfiança. Não obstante a manutenção
de um bom relacionamento ser sempre tarefa das duas partes envolvidas, cabe aos
professores um papel maior, por serem eles os profissionais e terem maior capacidade de
compreensão das diversidades encontradas na comunidade atendida pela escola.
8. Utilizar novas tecnologias
“A escola não pode ignorar o que se passa no mundo” (ibid, p. 125). O uso das
novas tecnologias não é defendido cegamente, mas de forma a convidar os professores a
3
uma reflexão crítica para que se distingam quais dispositivos tecnológicos são adequados
e como usá-los de modo a garantir pertinência ao aprendizado.
9. Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão
O professor não está imune às contradições da sociedade, e não se pode esperar
dele virtudes educativas muito maiores que as do contexto em que se insere. Deve-se,
mesmo assim, perseguir uma educação cidadã, que inclui, por exemplo, lutar contra
preconceitos e desenvolver o senso de solidariedade.
10. Administrar sua própria formação contínua
As competências relacionadas acima não são adquiridas ou mantidas sem que se
as exercite constantemente. Além disso, estudos e investigações do campo educacional
renovam e re-significam a prática docente, de modo que esse último conjunto de
competências contribui para viabilizar as demais.
No nosso trabalho, as competências que apareceram e para as quais temos
informações suficientes na pesquisa, são as reunidas nos grupos 1, 2, 4 e 10. Deste
modo, apresentamos, para esses grupos, a lista do que Perrenoud compilou quanto às
mobilizações específicas para o professor:
1. Organizar e dirigir situações de aprendizagem
a. conhecer, para determinada disciplina, os conteúdos a serem ensinados e sua
tradução em objetivos de aprendizagem
b. trabalhar a partir das representações dos alunos
c. Trabalhar a partir dos erros e dos obstáculos à aprendizagem
d. Construir e planejar dispositivos e seqüências didáticas
e. Envolver os alunos em atividades de pesquisa, em projetos de conhecimento.
2. Administrar a progressão das aprendizagens
a. Conceber e administrar situações-problema ajustadas ao nível e às possibilidades dos
alunos
b. Adquirir uma visão longitudinal dos objetivos do ensino
c. Estabelecer laços com as teorias subjacentes às atividades de aprendizagem
d. Observar e avaliar os alunos em situações de aprendizagem, de acordo com uma
abordagem formativa
e. Fazer balanços periódicos de competências e tomar decisões de progressão.
4. Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho
a. Suscitar o desejo de aprender, explicitar a relação com o saber, o sentido do trabalho
escolar e desenvolver na criança a capacidade de auto-avaliação
b. Instruir um conselho de alunos e negociar com eles diversos tipos de regras e de
contratos
c. Oferecer atividades opcionais de formação
d. Favorecer a definição de um projeto pessoal do aluno.
10. Administrar sua própria formação contínua
a. Saber explicitar as próprias práticas
b. Estabelecer seu próprio balanço de competências e seu programa pessoal de
formação contínua
c. Negociar um projeto de formação comum com os colegas (equipe, escola, rede)
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d. Envolver-se em tarefas em escala de uma ordem de ensino ou do sistema educativo
e. Acolher a formação dos colegas e participar dela
f. Ser agente do sistema de formação contínua.
CARACTERÍSTICAS CONSTRUTIVISTAS DO PROFESSOR
Dentre os autores que evidenciam preocupações prescritivas do construtivismo
(sua tradução da epistemologia para a pedagogia), apontamos algumas atitudes e
estratégias que devem estar presentes em uma metodologia de ensino construtivista.
Essas atitudes e estratégias estarão brevemente comentadas nos parágrafos que se
seguem.
O erro é um elemento motor do conhecimento (Bachelard, 1996). O aprendiz traz
para a sala de aula, previamente ao processo de ensino, concepções alternativas dos
conceitos e fenômenos, que o professor deve considerar e respeitar. Respeitar o senso
comum do estudante obviamente não significa que o educador deva manter-se nele, mas
que deva, sim, tomá-lo na importante condição de ponto de partida para o aprendizado, e
comprometer-se "no processo de sua neces sária superação" (Freire, 1996, p. 32).
O aprendizado ocorre através de mudança conceitual, ou nas palavras de
Bachelard (1996), pela psicanálise do conhecimento primeiro. O professor deve ser capaz
de perceber quais são os obstáculos de conhecimento primeiro presentes nos alunos
durante o ensino, e orientá-los em direção ao conhecimento científico coletivamente
aceito. Para isso, o professor deve ter também consciência dos seus próprios obstáculos
epistemológicos e saber meios de lidar com eles.
O obstáculo pedagógico se torna evidente a partir de problemas que a estrutura
cognitiva do sujeito não consegue resolver. O envolvimento ativo do aprendiz na
construção do conhecimento acontece quando este está motivado para a busca de
soluções. Dessa forma, valorizam-se, em sala de aula, atividades de caráter investigativo.
O aprendizado também é favorecido pelas interações sociais entre os sujeitos.
Assim, o processo de educar deve incluir a comunicação entre professor e aprendiz (e
também entre aprendizes). Nesse contexto, pode-se entender o termo comunicação no
sentido oposto ao de transferência, pois comunicação traz consigo a idéia de uma ação
com vários atores. Por outro lado, a idéia da transferência de conhecimentos nos remete,
como apontou Paulo Freire, à imagem de depósito, em que há um sujeito depositante – o
professor, possuidor da verdade, e os alunos não como sujeitos atores, mas como
"objetos" nos quais será efetuado o depósito.
Falar e ouvir as concepções de colegas em mesmo nível de aprendizagem serve
também ao propósito de explicitar de forma verbal a compreensão de um conceito. Muitas
vezes essa compreensão coincide com a que está em construção pelo sujeito, mas que
este não conseguiria expressá-la com clareza, em que pese consiga identificá-la na fala
do outro. Reconstruções da realidade atingem o grupo, mas "uma pessoa ou outra [...] se
antecipa na explicitação da nova percepção da mesma realidade" (Freire, 1996, p.92)
Assim, Paulo Freire também coloca como uma das tarefas do educador o estímulo a essa
troca e generalização grupal. Os conceitos e significados são construídos através da
interação social (Vigotski, 1998), e essa interação pode-se dar em vários níveis, onde a
esfera oral é apenas um deles, mas de valor inegável.
Finalmente, a intervenção deliberada, característica do processo de ensinoaprendizagem,
é fundamental para a maturação dos conceitos (Oliveira, 1992). Essa
posição não prescinde da postura dialógica que deve ser mantida entre alunos e
professor, mas ataca o "puro vai-e-vem de perguntas e respostas" (Paulo Freire, 1996),
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pela sua carência dos necessários momentos de explicação, sistematização e síntese
característicos do ato educativo.
O GRUPO ESTUDADO E OS DADOS
Acompanhamos professores que participaram, em 2005, de um grupo de estudos
em modalidade formação continuada. O grupo de estudos aconteceu no Instituto de
Física da USP e se intitulou “Eletromagnetismo no Ensino Médio: barreiras conceituais e
estratégias de ensino”. Foi coordenado pela professora Drª Jesuína Lopes de Almeida
Pacca.
Dentre as atividades que os professores realizaram estão momentos específicos
em que eles trouxeram relatos do que aconteceu nas suas salas de aula na semana.
Trazem também problemas e dúvidas que eles gostariam de ver comentadas pelos outros
participantes do grupo e pela formadora.
Os relatos semanais dos professores foram gravados em áudio e consistiram uma
fonte de dados, que complementamos com entrevistas individuais. Nestas, pedimos ao
professor para contar algumas aulas que ele ministrou no semestre – o professor
descreveu o encaminhamento dado a uma aula, a relação dessa aula com o
planejamento, os imprevistos que surgiram, e também os entornos da seqüência didática
– o que havia acontecido antes e o que o professor fez nas aulas seguintes, a partir dos
resultados da atividade.
O INSTRUMENTO
O instrumento elaborado foi essencialmente empírico e partiu do que o professor
foi capaz de relatar sobre a sua prática. Para a escolha dos critérios de seleção dos
dados, embasamo-nos no que a teoria previu que seriam características do professor
construtivista. Mantendo sempre a ponte entre dados e teoria, elaboramos um conjunto de
questões analíticas (Lüdke e André, 1996), situadas em quatro dimensões:
O professor e as estratégias
O professor e as habilidades
O professor e as atitudes
O professor e a avaliação das suas ações
O professor e as estratégias
As categorias reunidas na dimensão das Estratégias dizem respeito às ações de
cunho racional e planejado do professor para as suas aulas. Analisamos o modo como o
professor deu abertura para um tema ou atividade, de forma a motivar os alunos para a
sua realização; como ele desenvolveu uma atividade, como encaminhou o fechamento de
um tema e como organizou seu planejamento em relação à seqüência dos conteúdos.
Uma vez que, no grupo de estudos, os professores aprenderam a atentar para as
concepções alternativas dos alunos (e todos os professores realizaram atividades de
elicitação das pré-concepções) analisamos também o que os professores fizeram com
essas concepções no decorrer das aulas.
Como exemplo dos dados retirados das falas dos professores, podemos citar, na
categoria da motivação para as atividades: “Eu acho que foi assim, eles participaram
bastante, muito mais que antes. Porque valia nota, toda participação valia nota...”
6
Percebemos que a professora deste exemplo motiva seus alunos para a realização das
atividades através de pressões por rendimento.
O professor e as habilidades
Incluímos na dimensão das Habilidades categorias referentes ao tratamento que o
professor deu a domínios como a coesão entre as atividades de um mesmo tema, a
relação entre a matematização e o conceito físico e a flexibilização do planejamento com
o decorrer da prática.
As categorias apresentadas nessa dimensão, embora não sejam decorrências
imediatas do construtivismo, estabelecem um elo entre uma relação direta com a teoria
que pretendemos explorar e uma ligação direta com os dados reais que trazemos da sala
de aula. Trazem informações do conteúdo, do enfoque que o professor deu ao conteúdo e
da utilização que ele fez do plano de aula.
Por exemplo, o fato de o professor dar muito peso diretamente à formalização
matemática desvinculada do conceito físico (questão 7) denuncia contradição a uma idéia
do construtivismo, que prevê que o aluno, ao operar com a realidade num nível mais
superficial, vá paulatinamente definindo variáveis significativas, à medida que estas se
tornem, para ele, relevantes para descrever o fenômeno, e consigar aprofundar sua
compreensão e levá-la a um patamar de abstração. Um exemplo da atitude oposta, sobre
essa categoria, é observado na professora RO: “Eu fiquei frustrada, porque o mais legal
dessa parte é [a atividade experimental], né? O resto, as fórmulas [das associações em
série e em paralelo], é muito babaca, muito matemática, sabe?”
O professor e as atitudes
As Atitudes dizem respeito a ações do professor que têm um visível teor afetivo.
Dentro desse aspecto mais emocional, mostram o comportamento do professor na sala
de aula nas ações não planejadas que ele precisou “improvisar” no cotidiano de sua
atuação. Também essa dimensão traz grande aproximação com a realidade, nas relações
que o professor estabeleceu na sala de aula.
Sobre a questão 9 dessa dimensão, podemos citar uma fala da professora SZ:
“Então aí um aluno perguntou, ‘mas como será que a lâmpada é por dentro?’, e eu achei
tão engraçada essa pergunta, porque eu também pensei, ‘nossa, é mesmo, né?’ Então
nós combinamos de pesquisar e um outro aluno trouxe, na aula seguinte...”
O professor e a avaliação das suas ações.
Exige-se aqui uma tomada de consciência pelo professor do que ele fez, uma
reflexão sobre o seu trabalho. Essa dimensão traz informações sobre como o professor foi
capaz de analisar a sua atuação em sala de aula. Especialmente a questão de número 15
compõe uma síntese de várias situações que identificamos nos relatos, dentre elas, a
necessidade, se manifestada pelo professor, de encontrar critérios para justificar as
escolhas, a autocrítica que ele fez de alguma estratégia particular utilizada, e a autocrítica
induzida, durante a entrevista, quando o professor conseguiu identificar na questão da
entrevistadora, algum quesito que ele contemplou ou deixou de contemplar na aula. Como
exemplo: “Acho que é isso o que falta na minha aula, sabe, que é essa criatividade de
como começar a explicar, né, porque eu percebo que...”
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Categorias de análise – questões analíticas
O professor e as estratégias
1. Como o professor motiva a abertura de um tema?
a) questão para resolver / curiosidade.
b) atividade interessante.
c) pressão por rendimento.
2. Como o professor opera as concepções alternativas?
a) Usa para o desenvolvimento do conhecimento científico.
b) Detecta como os alunos pensam. Não conecta à seqüência de atividades.
c) Detecta o errado para definir o certo.
3. Como o professor conduz o desenvolvimento de uma atividade?
a) Existe expectativa (do ponto de chegada, objetivos de ensino), mas o professor
se abre a diferentes possibilidades de caminho.
b) Caminho único, expectativas fechadas.
c) Não há conexões da atividade com um objetivo em termos de conhecimento
científico.
4. Como o professor faz o fechamento de um tema ou atividade?
a) Complementa o conhecimento atingido pelos alunos durante a atividade.
b) Sintetiza oralmente o que os alunos fizeram.
c) Não faz.
5. Que lógica segue a seqüência aplicada pelo professor?
a) questão ® conteúdos para solução.
b) simples ® complexo.
c) seqüência randômica ou pré-existente (livro didático, etc.)
O professor e as habilidades
6. Como o professor dá unidade às várias atividades que pertencem a um mesmo tema
ou objetivo?
a) Consegue, para si e com os alunos, dar unidade à seqüência.
b) Preocupa-se com isso, mas não consegue concretizar com os alunos.
c) Professor não tem esse objetivo.
7. Como o professor opera conceito vs. formalização matemática nas aulas?
a) Equilíbrio e complementaridade.
b) Negligencia a matemática em favor do conceito.
c) Trabalha ambos separadamente.
8. Como o professor opera o planejamento conforme a prática?
a) Facilidade para encaixes, mantendo o fio condutor.
b) Utiliza sugestões, mas sem pertinência ao conteúdo ou à necessidade dos
alunos.
c) Não opera modificações relevantes.
8
O professor e as atitudes
9. Qual é o estado afetivo que o professor mantém durante uma atividade proposta?
a) Professor redescobre a ciência com os alunos.
b) Professor conduz a atividade “de fora”, verificando se os alunos estão no
caminho.
c) Professor acha muitas atividades desinteressantes e dá a aula por obrigação.
10. Como o professor, tendo em mente a seqüência pedagógica que ele planejou, reage a
manifestações ou perguntas dos alunos?
a) As perguntas servem-lhe de estímulo intelectual, ele as ouve com interesse.
b) Professor lhes dá atenção desde que pertençam à seqüência (se encaixem em
sua expectativa).
c) Professor lhes dá atenção se for em resposta a uma pergunta feita por ele
professor.
11. Quando o professor não sabe responder a uma pergunta do aluno, o que ele faz?
a) Estuda, junto com o aluno, para descobrir a resposta.
b) Estuda e leva a resposta ao aluno.
c) Responde de imediato (usa concepções alternativas ou algum raciocínio de
momento que produza uma resposta).
12. Como o professor vê o aluno?
a) Como um colaborador para a construção do conhecimento.
b) Como um sujeito pouco capaz.
c) Como um árbitro.
13. Que embasamento o professor busca, no curso de uma atividade, para descobrir
sobre resultados dos alunos?
a) Indícios provindos dos alunos durante a aula.
b) Sentimentos seus, do professor.
O professor e a avaliação das suas ações
14. O professor percebe quando um conteúdo não flui, com seus alunos, por falta de
domínio de conteúdo da parte dele?
a) Sim. b) Não.
15. Que consciência o professor demonstra dos fatores listados nas categorias
apresentadas?
a) Alta. b) Média. c) Baixa.
ANÁLISE
Olhando para o nosso instrumento com a ótica do conjunto de competências
descritas por Perrenoud, percebemos que é possível estabelecer correlações para quase
todos os itens do questionário. O que observamos:
A questão 1, sobre a abertura de um tema, relaciona-se à competência específica
do item (a) do grupo 4 de Perrenoud (4a). Não espelha o enunciado completo da
competência, mas concentra-se no quesito sobre suscitar o desejo de aprender.
Perrenoud, no entanto, considera igualmente válidas as alternativas em que o professor
9
fornece uma questão para resolver (nas palavras dele, um desafio intelectual), e em que
se procura motivar um tema através de atividades interessantes (jogos da aprendizagem).
O construtivismo, diferentemente, privilegia o desafio.
A questão 2, sobre concepções alternativas, relaciona-se às competências 1b e 1c
da lista de Perrenoud. A 1b fala sobre a importância do professor em fundamentar-se nas
representações prévias dos alunos, e 1c detalha um pouco mais o uso efetivo dos
obstáculos encontrados nessas representações, ao longo do percurso do ensino. A
competência 1c seria plenamente contemplada pelo professor que procedesse segundo a
alternativa (a) do nosso instrumento.
A questão 3 seria relacionada às competências 1a e 2a. A primeira competência
está contemplada quando o professor apresenta uma expectativa para a atividade, ou
seja, quando ele consegue definir objetivos claros que se relacionem aos conteúdos da
ciência. A outra competência (2a) estará parcialmente representada, pois é parte da
habilidade de administrar situações-problema, da capacidade de improvisação do
professor ao gerir a atividade, conforme recebe retorno de seu grupo de alunos que, no
nosso instrumento, inclui-se como a abertura do professor a diferentes possibilidades de
percursos da seqüência didática.
Para a questão 4, não encontramos correlação em Perrenoud. Essa questão nos
traz informações sobre uma concepção alternativa possível sobre o construtivismo.
Acontece de professores não realizarem uma sistematização adequada dos conteúdos,
porque esperam que os alunos irão construir, por si próprios, todo o conhecimento
científico. Essa competência provavelmente foi considerada pelo autor como mais
tradicional, visto que em seu livro ele salienta apenas as “novas competências”.
A questão 5 liga-se ao planejamento do professor quanto à lógica de sua
seqüência. Para o construtivismo, o mais adequado seria que o professor organizasse
seus temas a partir de questões significativas para os alunos, estimulantes para o
aprendizado. Perrenoud concorda em seu enunciado 1d: uma boa situação de
aprendizagem “coloca os alunos diante de uma tarefa a ser realizada, um projeto a fazer,
uma questão a resolver” (ibid, p. 35). A questão também é reconhecida na parte da
competência 2a da concepção de situações-problema (a segunda parte do enunciado
dessa competência será contemplada por outra questão mais adiante).
A questão 6 complementa a questão 5 quanto à capacidade de se por em prática o
que se planejou, dessa forma também se associa ao item 1d. Na prática, uma vez
instalado um problema, o professor deve intervir com várias atividades que ajudem os
alunos no caminho de sua solução. Se ele consegue, perceberá que sua seqüência
didática incluiu atividades que transpareceram serem parte de um todo coerente.
A questão 7 delimita uma competência específica do ensino de física. Apesar de
não encontrar estreita correlação na descrição de Perrenoud, liga-se, de modo mais
amplo, ao domínio de conteúdo que tem o professor (enunciado de Perrenoud 1a), pois o
conhecimento da física inclui estar à vontade com a linguagem matemática.
A questão 8 dirige-se à flexibilidade do planejamento do professor, guiada pelos
objetivos almejados. Isso requer um conhecimento amplo dos conteúdos essenciais e ao
mesmo tempo segurança quanto aos diferentes caminhos possíveis para alcançar as
metas de aprendizagem. Não há, em Perrenoud, uma competência específica que
designe essa capacidade, apesar de a identificarmos transversalmente a vários itens,
especialmente ao 2a, que evidencia a improvisação.
10
A questão 9 encontra conexões com 1e, embora um pouco vagamente, pois a
competência descrita não traga explicitamente esse foco. O autor, no entanto, sublinha a
relação do professor com o saber como condição para que consiga envolver os alunos.
Como a ciência tem um alicerce na descoberta, a atitude “curiosa” do professor
certamente auxilia para que o envolvimento ocorra.
A questão 10, de como o professor reage a manifestações dos alunos, se
aproxima de 2d, a competência de observar e avaliar os alunos em situações de
aprendizagem. A atenção ao aluno cumpre metas da avaliação formativa, conforme o
professor procura feedback regular do desenvolvimento e dos caminhos do pensar dos
alunos. Ouvir o aluno, no entanto, é também uma competência transversal a vários itens
específicos dos relacionados em Perrenoud.
A questão 11 é também complexa e converge fatores de várias ordens, como de
domínio de conteúdo, de autoconfiança e de reconhecimento, pelo professor, de seus
próprios obstáculos epistemológicos e idéias alternativas. Dessa forma, não é de se
estranhar não se encontre identificada pontualmente em um único enunciado de
competências. Talvez o mais próximo seja o 2c, que se refere a laços com teorias
subjacentes. No caso dos professores construtivistas, contexto da nossa pesquisa, se o
professor não aproveita os problemas que surgem dos alunos e, ao invés, fornece a
resposta sem dar oportunidade para que o aluno a encontre, está sendo incoerente com a
teoria de aprendizagem em que supostamente acredita e que quer aplicar.
A questão 12, tal como a 11, remete ao cenário da autoconfiança do professor e
de seu sentimento de domínio do conteúdo a ensinar. Também não a localizamos descrita
como uma competência específica.
Encontramos a questão 13 refletida em duas competências, ambas ligadas ao
segundo grupo de Perrenoud, a 2a e a 2d. O casamento com a primeira é menos direto e
refere-se à necessidade de procurar retornos dos alunos para bem administrar uma
situação-problema. Com a competência 2d, de avaliação formativa, apresenta conexões
mais diretas. Avaliação contínua, afinal, é observação contínua das aquisições do aluno.
A questão 14 evidencia a autocrítica do professor quanto ao conteúdo, e pode ser
aliada a duas competências – à 1a, quanto a conhecer o próprio conteúdo científico que
ensina, porém mais especificamente à 10b, da lucidez profissional do professor em fazer
seu balanço de competências.
Da mesma forma, a questão 15 relaciona-se ao grupo 10, que prevê que o
professor saiba explicitar as próprias práticas.
Analisando as competências, podemos, por exemplo, construir perfis dos
professores. Tomamos aqui, como ilustração, o professor MH – pode-se dizer que MH
sabe organizar e dirigir situações de aprendizagem, faltando-lhe, nesse grupo de
competências, apenas o item 1c. De fato, MH admite falta de habilidade em como
trabalhar com as pré-concepções dos alunos. Administra razoavelmente a progressão das
aprendizagens (grupo 2 de competências), nos itens que analisamos. Contudo, também
apresenta parcialidade no item 2a, pois raramente improvisa no curso de uma atividade,
mesmo percebendo indícios dos alunos. MH suscita em seus alunos o desejo de aprender
(item 4a que analisamos) e administra muito bem sua formação contínua.
11
CONCLUSÃO
Nosso instrumento de análise deu conta de todas as competências relacionadas
no grupo 1 e das do grupo 2 à exceção de 2b e 2 e, que prevêem conhecimento das
aprendizagens de todo o ciclo escolar. Do grupo 4, contemplou uma competência
específica e do grupo 10, as duas primeiras mobilizações.
Percebemos que esses são os grupos de competências mais específicos
referentes ao trabalho do professor dentro da sala de aula, em sua relação com o
conteúdo a ser ensinado, com as estratégias usadas e, com os alunos, especificamente
focando os objetivos diretos do aprendizado da ciência.
Embora concernente à sala de aula, o conjunto 3 de competências careceu de
indícios empíricos. Nossos dados sobre dispositivos de diferenciação, ou de como o
professor trata as diferença e a heterogeneidade em uma turma, foram insuficientes para
gerar uma categoria no instrumento de análise.
Não ficaram contempladas relações com alunos que prevêem outros objetivos,
como no grupo 9, que trata a ética. Também ficou de fora o grupo 8, do uso de
tecnologias. Todos os grupos que envolvem competências fora do ambiente de sala de
aula (grupos 5, 6 e 7 e parte dos grupos 4 e 10) também, naturalmente, esperávamos não
cobrir com o instrumento de análise proposto, dado o recorte inicialmente objetivado.
Apesar dessas lacunas, podemos concluir que o trabalho de categorização com
base na concepção construtivista do professor e da sua atuação se mostrou adequado
para dar conta das competências, tal como definidas por Perrenoud. O fato de não
encontrarmos elementos para relacionar todo o conjunto de competências definido se
deve ao fato de focalizarmos a atenção no planejamento do professor e sua aplicação na
sala de aula e de limitarmos o contexto ao trabalho dele em classe.
Essa proposta está sendo ainda trabalhada e esperamos poder completar melhor
a análise, favorecendo a discussão do que representa a competência do professor quanto
à sua atuação e contribuição para a aprendizagem significativa.
REFERÊNCIAS
PERRENOUD, P. Dez novas competências para ensinar. Porto alegre: artes Médicas
Sul, 2000.
BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico. Rio de Janeiro: Contraponto,
1996.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática da autonomia. 15a.
ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
LÜDKE, Menga e ANDRÉ, Marly E. D. A. Pesquisa em Educação: Abordagens
Qualitativas. São Paulo: E. P. U., 1996.
OLIVEIRA et al. Piaget, Vygotsky, Wallon: Teorias psico-genéticas em discussão. São
Paulo: Summus, 1992.
VIGOTSKI, L. S. Pensamento e Linguagem. 2a. ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1998

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